PRECONCEITO, MULTIPLICIDADE E ESCOLA
Taciano L. C. Domingues
Nos estudos sobre a
origem do homem, a antropologia relata que nos últimos vinte oito mil anos
existiam duas espécies de hominídeos, contudo somente o Homo Sapiens Sapiens
prevaleceu, o Homo Neanderthalensis foi extinto. Existem indícios de que essas
duas espécies tiveram contato, inclusive que uma causou o fim da outra
(BLUMRICH, 2020).
Existem referências
históricas da dificuldade da espécie humana em se relacionar com o diferente e com
a diferença. Para os Romanos e Gregos, todos outros povos da antiguidade eram
considerados bárbaros porque não falavam o mesmo idioma, não veneravam os
mesmos deuses e não tinham a mesma organização social (DICIO, 2021). Para se
tornar civilizado, o bárbaro teria que adotar os mesmos costumes do dito
civilizado. Sublinhamos que estamos descrevendo o comportamento de povos de há
mais de 2 mil anos, alguma semelhança com a atualidade não é mera coincidência.
Um exemplo mais próximo da
nossa história de como pode ser equivocada a apreensão da diferença, foi o
momento fundante do Brasil, Pindorama para os índios, em 1500 pelos
portugueses. O escrivão Pêro Alves Cabral retratou os autóctones como: primitivos,
inocentes, ingênuos; necessitando serem educados, catequizados e vestidos;
negando a cultura indígena (SEABRA, 2000).
Uma poesia muito bonita
sobre isso, “ERRO DE PORTUGUÊS” de Oswald de Andrade, poeta e escritor paulistano,
ex-marido de Tarsila do Amaral, importante membro da Semana de Arte Moderna de
1922: “Quando o português chegou debaixo de uma bruta chuva. Vestiu o índio.
Que pena! Fosse uma manhã de Sol. O índio teria despido o português”.
Todavia teria um grau alento
se a: alteridade, estrangeiro, forasteiro, alienígena, diferente, esquisito, alheio
fossem conceitos, palavras e expressões usadas somente para outras nações e
etnias; sarcasticamente não, é entre os membros da mesma cultura que as
dessemelhanças ganham maior força e são alvo de discriminação e preconceitos.
Nossa sociedade usa e abusa de modelos e padrões de: conduta, corpos,
pensamentos, objetivos de vida, amores, conhecimentos e de ensino; excluindo e
marginalizando o que não se enquadra.
Parece uma insensatez
essas afirmações sobre um povo multicultural como o nosso, mas podemos fornecer
alguns dados sobre isso. O Brasil foi o país que realizou o maior número de
cirurgias plásticas estética no mundo em 2020, a rinoplastia como principal
(FOLHA VITÓRIA, 2021). Isso mostra uma grande preocupação com os padrões de
beleza.
A LGBTfobia expõe a
dificuldade em conviver com o diferente. Numa pesquisa realizada em 2016 com
estudantes LGBTs, 73% deles informaram que foram agredidos verbalmente devido a
sua orientação sexual ou comportamento. (POLETIZE!, 2021).
E quando as diferenças
não são externas, não são interpessoais, são intrapessoais? O ser humano não é
uniforme na sua subjetividade, ele pode ser acometido por sentimentos,
pensamentos e ações diferentes que expressam a multiplicidade e não a sua
unicidade (CARDOSO JUNIOR, 1996). Portanto, uma pessoa pode apresentar várias
características diferentes, dificuldades e potencialidades.
Um exemplo dessa
multiplicidade são os gênios humanos (superdotação) que também apresentavam
dislexia (transtorno que dificulta a aprendizagem através de uma perturbação na
leitura e na identificação de fonemas). O físico Albert Einstein foi um exemplo
dessa dupla condição, inclusive existem relatos que ele só começou a falar
depois dos 6 anos idade (DIVULGAÇÃO DINÂMICA, 2021), sofrendo no ambiente
escolar porque não se enquadrava nos padrões esperados para os estudantes, nem
para “mais” e nem para o “menos”.
Foucault (2009) descreve
a escola como uma instituição que busca moldar o ser humano, promovendo sua padronização.
Refletindo sobre os escritos desse autor, podemos supor que a escola pode
tratar os dois lados da dupla condição com dificuldade, uma vez que o
estabelecimento de educação pode lançar o mesmo olhar para o que foge da fôrma,
do que não é esperado, mesmo que seja uma superdotação. Na busca de uma
uniformidade dos alunos, pode ocorrer tanto estranhamento do que está “abaixo
da média” (medicando no caso da Dislexia) quanto o que está “acima da média”
(ignorando as suas altas habilidades).
REFERÊNCIAS
BLUMRICH, L. Uma biografia pré-histórica. Revista de Arqueologia, [S. l.], v. 33, n. 2, p. 167–169, 2020.
CARDOSO JUNIOR, H. R. A origem do conceito de multiplicidade segundo Filles Deleuze. Trans/Form/Ação, São Paulo, 19: 151-161, 1996.
FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Rio de Janeiro: Vozes, 2009.
POLETIZE!, c2021. Página inicial. Disponível em: <https://www.politize.com.br/>.
R7. FOLHA VITÓRIA, c2021. Página inicial.
SEABRA, J. A. Descoberta do outro na carta de Pero Vaz Caminha. Revista de Letras e Culturas Lusófonas, [S. l.], n. 8, p. 63-71, jan./mar. 2000.
SETE GRAUS. DICIO – Dicionário Online de Português, c2021. Página inicial.
The Education Club. Divulgação Dinâmica, c2021. 20 personalidades famosas com dislexia.
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