“Tenho apenas duas mãos
e o sentimento do mundo,
mas estou cheio de escravos,
minhas lembranças escorrem
e o corpo transgride
na confluência do amor.”
Meu poeta preferido é Carlos Drummond de Andrade, autor dos versos acima. Neles algo me fascina, e às vezes me pergunto porquê. Em sua genialidade, a mensagem não poderia ser simples, mesmo assim, me inspira confiança. Não que algo incrível precise ser difícil de entender... não é preciso filosofar apenas em Alemão... A genialidade de Lacan não está no fato de ser autor de leitura árdua.
Sem mais rodeios, vamos pensar no versos... Começa falando de sua castração, se colocando numa posição humana frágil, demonstrando o real do corpo... “tenho apenas duas mãos”.
Mas neste ser tão meramente humano, cabe todo o sentimento do mundo – é como se sofresse de uma ultra sensibilidade, pois como seria possível uma coisa destas: todo o sentimento do mundo... diria que toca o infinito.
O terceiro verso se coloca em contradição aos anteriores – mas estou cheio de escravos – como assim? Cheio de pendências? Coisas que não têm liberdade? Desejos acorrentados, revolta...
“Escorrem as lembranças”, tantas coisas se passam pela mente de quem percebe todo o sentimento do mundo. Acredito que as experiências mais marcantes envolvem alguém que amamos, odiamos ou que despertam aquilo de que se trata o poema: sentimentos. Muitos idosos descrevem certo cansaço por carregarem , ou guardarem, tantas lembranças.
E num toque brilhante, os versos finais ligam a ideia inicial que remetia ao corpo a algo que vai além... sim, todo este sentimento e lembrança feita de matéria tão fluídica habita um corpo ardente, pulsante. E nada melhor de que o amor para explicar a união do corpo e da mente . Eu disse explicar? Não sei o que é mais complicado – falar sobre o amor, ou sobre a dualidade ou não, do corpo e da alma... enfim, acho que descobri o que me encanta nestes versos.
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